Tuesday, August 10, 2010

A Origem do Petróleo ou Ao Plâncton com Carinho

Preliminares

Apesar de se falar corriqueiramente a respeito da produção de petróleo e demais hidrocarbonetos, empresas como Exxon-Mobil, Shell, BP e Petrobrás não produzem petróleo, apenas o extraem. E de fato, da mesma forma que os geólogos dessas companhias dominam a arte da prospecção, sabem que os hidrocarbonetos se formam apenas em estruturas e condições geológicas bastante específicas, ao longo de centenas de milhões de anos (nove dígitos galera! nossa presença não excede nem a casa dos 200 milhares), por meio de processo que o ser humano não pode replicar.

Agora sim vamos ao que interessa, vamos atacar o funcionamento da verdadeira produção de hidrocarbonetos e entender porque se trata de um recurso não renovável.
Mas antes disso, cabe uma brevíssima digressão, quase uma monogressão (não teve graça né...). Por que me refiro a hidrocarbonetos e não simplesmente ao petróleo? Porque quero contemplar também as frações mais leves, que predominam em campos de gás natural, ou seja, metano (CH2, 70-98%) e etano (C2H6, 1-10%).

Dito isso, vamos direto ao ponto. O processo de formação das reservas naturais de hidrocarbonetos é constituído pelos seis elementos a seguir.

 
Geração

Em primeiro lugar, ESQUEÇAM OS DINOSSAUROS! Sim eles são bem legais, concordo, mas pouco têm a ver com petróleo, tampouco com gás natural. A matéria orgânica que dá origem ao líquido negro poluente que tanto valoramos é muito mais tediosa, de porte bem menor, aliás, MICROSCÓPICA, porém essencial à nossa sobrevivência. Estamos falando dos plânctons, sim aquelas criaturas retratadas de modo tão injusto na série de animação “Bob Esponja”. No desenho animado, o plâncton é personificado por um ser perverso cujo único propósito é roubar a receita do hambúrguer de siri do Sr. Sirigueijo. Contudo, o plâncton da vida real, além de produzir em vida a maior parte do oxigênio que respiramos, seus restos mortais foram depositados ao longo de milhões de anos no fundo do oceano e deram origem às rochas geradoras de hidrocarbonetos.
Você deve estar se perguntando, (a) como é possível saber que o petróleo não é feito de dinossauros? (b) Se a matéria orgânica originária é o plâncton, por que grande parte das reservas encontra-se em campos on-shore (em terra firme)? Os próximos parágrafos devem elucidar esses pontos.
Se pudéssemos voltar no tempo 200 milhões de anos, nadaríamos nas águas quentes e calmas do antigo Mar de Tethys (Ver figura abaixo), cuja latitude limitada entre os trópicos restringia a ação de correntes marítimas. A ausência de fortes correntes criara um ambiente anóxico, extremamente favorável à deposição dos plânctons sob reduzidas oxidação e digestão por bactérias aeróbias. Em virtude disso, o fundo do Mar de Tethys, ao contrário da superfície onde andavam os dinossauros, era propício à preservação da matéria orgânica. Dessa forma, criou-se uma rica camada lamacenta no assoalho oceânico que, com o passar do tempo e progressão do ajuste das placas tectônicas, foi fossilizada e exposta à superfície. Em adição, essa camada fóssil, comumente na forma de folhelhos, foi coberta por sedimentos de naturezas diversas, que eventualmente transformaram-se em rochas sedimentares e formaram o subsolo do que hoje conhecemos como Oriente Médio, região onde situam-se as maiores reservas de petróleo já descobertas.
Conforme as camadas sedimentares superiores tornavam-se mais espessas, a camada inferior de folhelho era submetida à temperatura e pressão cada vez maiores, o que desencadeou a conversão da matéria orgânica armazenada em seu interior em hidrocarbonetos.

Migração

Já temos então a reserva de óleo/gás? Não, nossos hidrocarbonetos ainda precisam migrar, então como isso ocorre? No caso de rochas pouco permeáveis como os nossos folhelhos, a hipótese mais provável é que a migração ocorreu por meio de microfraturas que, ao aumentar a interface entre os poros onde se localiza o óleo/gás, criam vias de escape que permitem sua migração para a rocha reservatório. Entretanto, essa teoria não é ponto pacífico e motiva discussões acaloradas em bares próximos a faculdades de geologia ao redor do mundo, mas deixemos isso para os geonerds.

Rocha Reservatório

Uma rocha reservatório ‘da boa’ deve possuir alto grau de porosidade granular e permeabilidade, para garantir tanto a armazenagem de um volume grande de hidrocarboneto quanto a facilidade de extração. No Brasil, tais rochas são representadas por arenitos e calcarenitos, ambas sedimentares.
Ok, mas se a rocha reservatório é bastante permeável, os hidrocarbonetos não escapam para superfície? Se não houver mais nada impedindo seu progresso a resposta é sim e, ao chegar à superfície, seriam perdidos devido à exsudação, oxidação ou digestão bacteriana. Isso nos leva à necessidade de um bloqueio, que será satisfeita logo abaixo.

Rocha Selante

O que pode impedir a fuga dos hidrocarbonetos é justamente a rocha selante que, em contraposição à rocha reservatório, deve ser impermeável para impedir a passagem do óleo/gás. No Brasil, os evaporitos predominam.
Contudo, isso ainda não é suficiente para aprisioná-los, o formato das rochas selantes pode criar condições para que sejam contornadas. Dessa maneira, passamos a seguir para a geometria da rocha.

Trapa

Para que os hidrocarbonetos sejam aprisionados em suas rochas reservatório, é preciso que as seladoras apresentem a forma de uma armadilha, capaz de impedir a migração de zonas de maior pressão para as de menor pressão como a superfície.


Sincronismo

Agora sim temos toda a estrutura geológica necessária à existência de uma reserva de hidrocarbonetos, porém ainda não é o suficiente.
Digamos que um geofísico realiza o mapeamento sísmico de um potencial campo e, a partir das imagens que só eles conseguem ler, consegue inferir que ali há uma estrutura completa, semelhante a da Figura 1. Mesmo assim, ao colocar a sonda em ação, ainda há a possibilidade perfurar um poço seco.
Suponha que o óleo/gás saia do folhelho, migre para o arenito, mas contorne o evaporito devido à configuração incapaz de prendê-lo e, por conseguinte, atinja a superfície onde é exsudado, oxidado ou digerido por bactérias. Depois disso, imagine que haja acomodação das placas tectônicas que modifique a geometria da estrutura, de modo que o resultado seja a configuração da armadilha observada pelo nosso amigo geofísico. Dessa forma, apesar de ter sido identificada a estrutura completa de uma reserva de hidrocarbonetos, a cronologia dos eventos geológicos impediu que eles fossem lá retidos.
Posto de outra forma, é preciso que haja sincronismo específico entre geração, migração, armazenagem e aprisionamento, para que tenhamos uma reserva natural de hidocarbonetos.
Ufa! Agora sim conseguimos satisfazer todas as condições necessárias para gerar e aconchegar nossos amigos hidrocarbonetos em seus lares. Não obstante, demoramos centenas de milhões de anos e os restos mortais de incontáveis plânctons foram desperdiçados em exsudação/oxigenação/degradação bacteriana para que obtivéssemos alguns milhares de reservas.
Logo, uma vez exauridas tais reservas, não será possível repô-las. Daí como será a vida após o término da sociedade dos hidrocarbonetos? O que acha de voltar para o campo? Diga oi para o nosso brother Malthus...







Figura 1: Estrutura de uma reserva natural de hidrocarbonetos





Não disse que só os geofísicos conseguem ler as imagens do mapeamento sísmico?
















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